Quando perguntamos para
um são-borjense do meio musical da cidade, quais eram as bandas que São Borja
teve no passado; certamente ele vai citar o nome Os Dinâmicos. Isso porque esse grupo fez história. E uma longa história.
Os Dinâmicos foi um dos
grupos de baile seminais de São Borja. Antecede Os Soprantes e Os Sheiks. Foi o
berço de muitos músicos da cidade e talvez o grupo são-borjense que ficou mais
tempo em atividade.
A banda surgiu na
metade da década de 1960, no bairro do Passo. Bairro conhecido como um dos que
mais revelaram e revela músicos e bandas de qualidade, por conta da presença das
bandas de escola. E Foi a partir de uma, a Banda do Colégio Olavo Bilac (antiga
Banda Cesar Pitoni, e hoje, Banda Municipal Tusnelda Lima Barbosa), que Alberto
Roque Matoso (sax), Errol Nunes Caetano (trombone) e Algemiro Moiano Ribeiro
(mais conhecido como Canário - bateria); se aventuraram a criar um conjunto
próprio para baile. Na época, a diretora da escola era a professora Tusnelda
Lima Barbosa, que acabaria sendo a figura chave para a fundação da banda.
Alberto Roque Matoso,
um dos criadores do grupo conta como foi o inicio de tudo: “A nossa turma era
toda da banda do colégio e quando eu levei para a professora Tusnelda o projeto
de fundar o conjunto pra baile, ela nos deu todo o apoio; desde que a turma
fosse toda da banda do Olavo Bilac. Agradeço muito a ela, até hoje”.
Matoso lembra que os
instrumentos que a banda tocava eram todos da banda do colégio. Ela, a
professora Tusnelda, emprestava os instrumentos e também uma sala de aula para
fazerem os ensaios: “Nós ensaiávamos numa sala do Olavo Bilac. Terminava a aula
às cinco e meia, então ensaiava a banda da escola, e quando terminava o ensaio
da banda da escola era a vez d’Os Dinâmicos”.
Uma das primeiras
formações da banda, além do Matoso, do Errol Nunes Caetano e do Canário,
completavam a equipe o Joel Nascimento (contrabaixo), José Alves e Luis
Ferreira Jardim (Pato). Nessa época, bem no inicio, Matoso conta que a banda
não tinha instrumentos eletrônicos, só tinham bateria, bumbo, surdo, caixa,
instrumentos da banda do colégio mesmo. Tocavam somente música orquestrada. A
partir daí que surgiram Os Dinâmicos. “Não tínhamos meios financeiros. Não
tínhamos instrumentos. Tudo era da banda do colégio. Bateria não tinha. Mas
tínhamos um bumbo, que ela nos permitiu fazer um furo pra colocar um prato. O Canário
tocava no Clube Comercial nas boates sentado num engradado de Coca Cola, porque
não tinha banco. Só bem depois que a banda foi modificando e se
profissionalizando. Fomos evoluindo aos poucos”, lembra o fundador e líder do
conjunto.
Uma recordação interessante
que Matoso compartilhou é de que a banda, na época da escola ainda, se locomovia
por meio do transporte urbano mesmo: “(...) tinha um ponto de ônibus bem na frente
da escola. Cada um pegava seu instrumento, eu pegava o sax, o João Carlinhos
pegava o trompete dele, o Canário pegava um bumbo, uma caixa e um prato, subíamos
no ônibus e íamos tocar no comercial. Na época a gente não tinha esses
recursos. A gente descia do ônibus, carregávamos os instrumentos e íamos tocar
no clube.”
Os Dinâmicos nos seus primeiros anos
Com o passar do tempo, Os
Dinâmicos foram sendo requisitados cada vez mais para se apresentarem.
“Nós
começamos tocando em bailes no Clube Fraternidade, depois subimos para o Clube Recreativo
e lá tocamos durante 25 carnavais consecutivos; só bem depois passamos a tocar
no Clube Comercial. Até irmos tocar no Recreativo a gente não tinha tocado
carnaval ainda, a gente tocava em bailes. Nosso conjunto era um grupo de baile”,
explica Matoso.
Os Dinâmicos
presenciaram e animaram por toda a sua existência os bailes da cidade. As
festas macabras, a famosa fase das luzes negras (em que as roupas brilhavam no
escuro), os bailes dos bichos, as reuniões dançantes nos domingos, as
apresentações nas escolas... Também embalaram sempre o carnaval da cidade,
tanto o de rua, como o de salão. Isso em tempos em que os bailes de carnaval
tinham mais glamour. Na época em que
começavam a meia-noite e acabavam às cinco da manhã. Do tempo que os grupos
puxavam os blocos das ruas e adentravam no salão com os foliões pulando. Quando
os integrantes dos conjuntos se diferenciavam do público pelas roupas e
fantasias coloridas. Uma época áurea que foi se dissipando aos poucos.
Os Dinâmicos no ano de 1972, em mais uma de suas famosas entradas no carnaval do Clube Recreativo: Errol Nunes Caetano, Zé de Sousa, Matoso e João Moiano
O grupo tocava em toda
a região. Em Itaqui, Uruguaiana, São Luiz Gonzaga, Jaguari, Alegrete, Santo
Antônio das Missões. “Fazíamos toda essa região. E em épocas difíceis que não
tinham estrada. Para irmos tocar num baile em Jaguari, nós levávamos quase um
dia para chegar. Viajávamos em duas Kombis, uma carregando o pessoal e a outra
os instrumentos”, recorda Matoso.
Foram muitas vezes
contratados para se apresentarem para nossos hermanos também. Fizeram muitos shows
em Posadas e em Santo Tomé, essa principalmente. Acabava o carnaval daqui e iam
animar o de lá.
Nessa época, os bailes
com conjunto eram muito mais frequentes do que hoje. Até pelo fato do som
mecânico não ter chegado ainda. A demanda exigia dedicação: “Nós ensaiávamos na
minha casa, até quatro horas por dia. Isso todos os dias da semana. Tocávamos
quarta, sábado e domingo. Mas naquela época era muito melhor do que agora. Hoje
a coisa anda mais difícil pra música. Existiam muito mais clubes em São Borja. O
mercado era muito grande. A gente não vencia. Chegamos até recusar contratos”,
conta Matoso.
Por ser um conjunto de
baile, o repertório d’Os Dinâmicos era variado. Tocavam os sucessos do momento
da música nacional e internacional. The
Fevers, Renato e Seus Blue Caps, Os Incríveis, eram só algumas das bandas
que tocavam. Matoso conta também que trouxe três músicos de Santo Tomé para
tocar na banda; um cantor, um tecladista e um contrabaixista. Isso com o
intuito de executar músicas da banda uruguaia Los Iracundos, que fazia muito sucesso na época. A lambada e os
sambas-enredo das escolas do Rio de Janeiro faziam parte da lista de músicas
também.
No carnaval,
obviamente, tocavam só samba. Na época não existia o axé music. As músicas de artistas locais, as que concorriam nos
festivais de músicas para o carnaval da cidade, o grupo incluía no repertório. “Digamos que 30% do repertório d’Os Dinâmicos
eram musicas daqui de São Borja, de autores daqui, defendidas por nós no
festival ou não. A vencedora marcha, a vencedora samba, as vezes alguma outra
lá que não ganhava mas que achávamos que era melhor da que ganhava. Todas essas
nós colocávamos no repertório, como por
exemplo: o samba “Dia - a – Dia”, do Clemar Dias. Foi um samba que marcou. Nós tocávamos
essa música sempre. Daí a importância
desse festival”,
Não fosse pelas fotografias,
seria muito difícil recordar detalhes sobre a banda. Mesmo com as fotos, Matoso
tem dificuldade de lembrar do nome de todos os integrantes que passaram pela
banda. Afinal, pelas suas contas, passaram 63 músicos pelos Dinâmicos, em todos
esses anos de história. “Dos que iniciaram comigo, somente dois não saíram. Da
época da fundação só o Canário e o Caetano que foram até o final, os outros
foram sempre trocando.”
Muitos músicos
são-borjenses participaram d’Os Dinâmicos. Nomes como: Lady Mendonça, Alfredo
Ramos, Joel Nascimento, João Moiano Ribeiro, Mário Nei Bitencourt, Dorival
Pimentel, Adalberto de Oliveira, Paulo Vicente, João Carlos Lopes, Luis
Ferreira Jardim, José Alves, Eraldo, Vitor Ramires, Luiz Eriberto Brum, Jorge
Dornelles, César Lindemeyer, José Nairo, Paulo Pires, Roberto Durão, Claudia
Durão, Zé de Souza, entre muitos outros.
O conjunto numa de suas inúmeras formações, no palco do Clube Esperança: Mário Nei Bittencourt, Sérgio Sousa, Cláudia Durão, Canário, Roberto Durão, Lady Mendonça, Matoso e João Moiano
Faltavam músicos na
banda, Matoso ia sempre atrás. “O grupo teve integrantes de outras cidades, de
Porto Alegre, Santa Maria, Santo Ângelo, São Luiz Gonzaga, Itaqui e Uruguaiana.
Até um uruguaio e um carioca cantaram na banda. De Uruguaiana nós tivemos o Caco,
um tecladista cego, até hoje não conheci um melhor que ele; o Antão, tecladista
e gaiteiro; e o Nonato, que cantava um samba como ninguém. De Itaqui veio o
Sérgio Wagner de Sousa (atualmente toca nos Angüeras e acompanha o Mário
Barbará), o Dodô (contrabaixista), o Sapo (Anadir Bacelar).”
Na década de 1970, existiu
uma grande ligação entre Os Dinâmicos, Os Soprantes e Os Sheiks. Um foi dando
surgimento ao outro. Através da troca que ocorria de integrantes entre as três
bandas. Matoso recorda até de uma ocasião de solidariedade que ocorreu certa
vez: “Os Sheiks, uma época, estava se apresentando no Clube Fraternidade nos
sábados. Num desses bailes, o conjunto se acidentou na vinda, na esquina do
Posto Ipiranga. No dia domingo, eles tinham uma reunião dançante no Clube Sete
de Setembro. Eles não puderam tocar, por terem se acidentados, e então, nós (Os
Dinâmicos) os substituímos e no dia seguinte entregamos o cache para eles”.
Outro período que
Matoso se orgulha de rememorar era quando tinham um programa de calouros no
Cinema Presidente, nos sábados à tarde, na extinta rádio Fronteira do Sul: “Nós
ensaiávamos com os calouros, o Cerzo Brites e o Boni Lima faziam o aparato todo
pra transmitir o programa, e o professor Ivonie Marques apresentava. Entravamos
com os calouros pra ensaiar e acompanhá-los durante o programa. Fizemos isso
por muito tempo. O cinema lotava sempre.”
Durante 37 anos de
existência Os Dinâmicos nunca pararam. Mudavam os integrantes, mas nunca
deixaram de tocar. Conseguiram resistir a fase do som mecânico, que pôs fim a
muitas bandas da região. Talvez por se apresentarem bastante em outras cidades
tenha contribuído para a longa carreira do conjunto.
“Fomos sempre bem
recebidos nas cidades em que tocamos, e na argentina também. Sempre procuramos
trabalhar bem, colocar qualidade, responsabilidade, com profissionais bons;
porque manter uma equipe boa, de confiança, não é fácil. Tem que ser
profissional mesmo, e a gente foi crescendo assim e fomos indo. Ficamos todo
esse tempo aí porque sempre procuramos fazer um trabalho bem feito. O melhor
que podíamos”, conclui Matoso.
Encerraram as
atividades por volta de 2004. Os tempos eram outros e não existia mais uma
valorização como antes. Mas quem viveu aqueles tempos dificilmente vai se
esquecer dos bailes e carnavais animados pelos Dinâmicos.
Início dos anos de 1970, no Clube Recreativo: Matoso, João Carlinhos, José do Nascimento e Canário
Musiviola:
o papa-títulos do Festival de Carnaval
Os Dinâmicos também se
apresentavam nos festivais de musicas para o carnaval da cidade. Porém, na
maioria das vezes, subiram ao palco com a alcunha de Musiviola. Apresentaram-se
também como O grupo.
O Musiviola (que era
originalmente o nome da escola de música de Sergio Wagner de Souza, integrante
do conjunto) ganharam quase todas as edições que participaram. De acordo com
Matoso, chegaram a ganhar 11 anos consecutivos. “Nós ganhávamos, às vezes, em
marcha e samba. E também por melhor intérprete, melhor arranjo e melhor
instrumentista. As letras, em sua maioria, eram do Caéco Batista e do Otorino
Côvolo.”
As músicas que a banda
defendia nos festivais prontamente entravam no repertório d’Os Dinâmicos para
os bailes de carnaval. Algumas conquistas e sucessos do grupo foram: “A Pau e
Corda” (samba- letra e música de Otorino Côvolo e Sergio Souza); “Rimas e Penas”
(marcha - letra de Jones Martins e Otorino Côvolo e música de Sérgio Souza); “Igual
Cigarra” (samba – letra de Eugênio Dutra e música de Sérgio Souza), “Faixa,
Saudade e Carnaval” (marcha de autoria de Otorino Côvolo),“Palhaços” (marcha - com
letra de Caéco Batista e música de Sérgio Souza), “A Mesma História” (de autoria
de Nivea Fonseca Mendes e João Carlos Lopes), “Uma Pequena Marcha Para Um
Grande Amor” (marcha - letra de Otorino Côvolo e música de Sérgio Souza, e o
samba “Promorar” (letra de Eugênio Dutra e música de Sérgio Souza).
7 comentários:
"Grande emoção" é o que sinto ao ler esta reportagem sobre os bons e inesquecíveis tempos de Os Dinâmicos lederado pelo amigo Roque na época, onde iniciei minha vida artistica revelando meus dotes de "baixista" pela oportunidade que me foi dado em tocar nos Dinâmicos e que abriu caminhos em outroas bandas que passei.Agradeço a lembrança de lembrar meu nome esperando ter colaborado e feito historia junto com todos os amigos .Grande abraço ao idealizador dessa matéria de reportágem...obrigado. Joel Nascimento
muito interessante.
a banda já faz parte de são borja.
Grande reportagem, conheci o canário, o Roque Matoso, e principalmente conheço muito bem o Errol, pai de meu brother Gustavo que infelizmente nos deixou em 2002, uma grande perda. Detalhe também para a foto com o Roberto Durão e a cláudia durão.
Parabéns ao blog por trazer essas lembranças. Consegui acompanhar alguns artistas dessa banda... E era bommm.vcs estão de parabéns....
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Parabéns ao blog por trazer essas lembranças. Consegui acompanhar alguns artistas dessa banda... E era bommm.vcs estão de parabéns....
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